Trabalho infantil atinge 158 mil crianças baianas
Segundo IBGE, atividade interfere negativamente nas taxas de escolaridade
de menores entre 5 e 13 anos.
Ciro Brigham
Fonte: Correio da Bahia
O trabalho infantil remunerado e não-remunerado, que atinge 158 mil crianças baianas entre 5 e 13 anos (6,4% do total), reflete direta e negativamente nas taxas de escolaridade e freqüência escolar. O dado está nas estatísticas do documento Aspectos complementares de educação, afazeres domésticos e trabalho infantil, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2006, divulgado ontem pelo Instituto Nacional de Geografia Estatística. Entre outros aspectos, os números da Pnad também revelam que mais da metade das crianças e adolescentes baianos exerce afazeres domésticos e 54,8% desse universo dedica acima de sete horas semanais à realização de tarefas dentro do próprio domicílio.
Dos 3,61 milhões de baianos inseridos na faixa dos 5 aos 17 anos, 50,9% (1,83 milhão) exerciam afazeres domésticos em 2006, número pouco acima da média nacional, que é de 49,4% (22,1 milhões). Do total no estado, 68,3% (1,25 milhão) viviam na linha de pobreza, ou seja, tinham rendimento mensal domiciliar igual ou inferior a meio salário mínimo per capita (a média nordestina é de 70%). Outros 22% (403 mil) viviam em lares cujo rendimento não ultrapassava um salário mínimo. O dado demonstra a relação direta entre a condição econômica da família e a necessidade de participação de cada membro nos afazeres domésticos, cenário ainda mais comum no meio rural.
Na Bahia, 45,2% dos meninos e meninas que exerciam atividades como arrumar a casa, cozinhar, lavar ou passar roupas utilizavam até sete horas semanais para isso; 31,7% gastavam entre oito e 14 horas; 12,3% entre 15 e 20 horas e 10,8% dispendiam tempo superior a 21 horas semanais na realização desses afazeres. Na média nordestina, mais da metade dedicava sete horas semanais às atividades caseiras, sendo que 14% gastam mais de 21 horas.
Escolarização - Mas em que medida esses afazeres, que não têm relação com o trabalho infantil e estão ligados às estratégias familiares de sobrevivência, influenciam nas taxas de escolarização? “Para os três últimos grupos, onde o tempo dedicado é superior a oito horas, o nível de comprometimento com os afazeres compete com a escolarização, situação que em muitos casos é agravada por outros fatores”, interpreta o coordenador de disseminação de informações do IBGE na Bahia, Joilson Rodrigues Souza.
Apesar disso, nove em cada dez crianças e adolescentes que exerciam atividades em domicílio próprio freqüentavam a escola, e em todas as faixas, a taxa de escolarização era superior à daqueles que não desempenhavam afazeres domésticos. “A inserção dessas crianças e adolescentes nas atividades domésticas compreende também uma relação de aprendizado, participação e contribuição, o que desenvolve o senso de responsabilidade também para o estudo”, sugere Souza.
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Divisão de tarefas domésticas
A renda mensal da lavadeira Zenaide Santiago dos Santos, 46 anos, moradora da travessa Capitão Aristeu (Alto de Ondina), é de R$400. Tendo o marido desempregado há dois anos, cabe a Zenaide – com auxílio dos R$112 do Bolsa Família – o grosso do sustento de oito filhos (com idades entre 6 e 29 anos) e duas netas que vivem na casa. Na lida dos afazeres domésticos, Fernanda, 10, Maiara, 11, e Damelis, 15, ajudam como podem e de acordo com suas capacidades: varrem a casa, arrumam as camas, lavam louça, põem e tiram a mesa.
Mas não são as únicas. Enquanto a mãe diz que não gosta de criança perto do fogão, a pequena Isabela, 6, carrega a sobrinha Adriele, de apenas 2, rebento de Cássio, que tem 21. Misto de brincadeira e olhar. Apesar das visíveis privações econômicas e da distribuição de afazeres entre os pequenos, as crianças e adolescentes da casa (exceto a pequena Adriele) estão todos matriculados na Escola Evaristo da Veiga e freqüentam as séries correspondentes às suas idades.
Perto dali, a adolescente Caroline Aparecida, 12, ainda com o uniforme escolar, conta que ajuda em algumas atividades de casa, como varrer o chão, arrumar um lençol, colocar uma roupa no varal, fazer um suco. Ao irmão mais novo, Igor, 10, cabe jogar o lixo fora e comprar o pão de manhã.
Segundo o padrasto Sandro Santos, 26, são funções esporádicas e que diminuem bastante de intensidade durante o período escolar. Caroline e Igor estão na 7ª e 5ª série, respectivamente.
“Não são obrigações, mas somente uma questão de ajudar um pouco em casa. Se Caroline vê, por exemplo, que o filtro está sem água, ela vai e enche pra que todo o mundo possa beber”, explica o padrasto, que é casado com Jucilene Carneiro, 30, e diz ter renda mensal de R$2.000 como técnico de vídeo.
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Baixa freqüência escolar
Além de crime, o trabalho infantil (de 5 a 13 anos) tem reflexo direto tanto nas taxas de escolaridade quanto na freqüência escolar: é o que também demonstra a pesquisa do IBGE, ao cruzar os dados de crianças e adolescentes ocupados e não ocupados. Na Bahia, dos 2,47 milhões de crianças entre 5 e 13 anos, 158 mil (6,4%) estavam ocupadas na semana de referência da investigação. Na faixa entre 14 e 17 anos (1,124 milhão de adolescentes), o nível de ocupação subia para 30,4% (342 mil adolescentes).
Dentre os 500 mil baianos com idades entre 5 e 17 anos que desempenhavam alguma ocupação, 409 mil (81,7%) freqüentavam a escola e 91 mil (18,3%) não. Já entre os 3,101 milhões que não trabalhavam, o percentual de freqüências era maior: 2,805 milhões (93%) freqüentavam a escola e 217 mil (7%) não. “A ocupação promove a não-freqüência sobretudo na medida em que a idade avança”, coloca o coordenador de disseminação de informações do IBGE, Joilson Souza.
Faltas - A pesquisa investigou também as faltas escolares: 62,9% dos baianos com até 17 anos matriculados em escola pública (84,5%) declararam ter comparecido todos os dias às aulas. Dentre os 37,1% faltosos, 79,14% não compareceram por um a cinco dias e 20,6% faltaram seis dias ou mais. Mais de 62% declararam doença como motivo; 11,2% não foram por vontade própria ou dos pais ou responsáveis, e nada menos que 14,2% deixaram de ir à escola por falta de transporte, por causa da distância, por não ter quem os levasse ou ainda por greve ou falta de professores.
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