sexta-feira, 29 de abril de 2011

Gaspar Sadoc:"Em nenhuma religião se pode querer perfeição. "

O HOMEM É UMA OBRA-PRIMA FEITA POR DEUS

Por Cíntia Kelly

Há quanto tempo o senhor está na vida religiosa?
Monsenhor Gaspar Sadoc – Fui ordenado em 1941. Em 42 eu tomei posse da primeira paróquia, que foi no bairro da Liberdade. Naquela época, era um lugar cheio de criança, havia falta de água, mas gostei muito de ter estado lá. Depois fui para a Igreja de São Judas Tadeu, em Baixa de Quintas, onde nós construímos o Santuário de São Judas Tadeu. Foi lá que aprendi a conviver com outras religiões. Fiquei lá durante 18 anos e depois vim para a Vitória.

Bom, o senhor antes de ir para Vitória fez um trabalho religioso em duas comunidades pobres. A relação entre o senhor e os fiéis é diferente de um lugar para outro?
MGS – Não, de forma alguma. Na verdade as pessoas são iguais independentemente do lugar em que elas vivem. Existe pobre bom e pobre ruim. Existe rico bom e rico ruim. E esses dois estão presentes na Igreja.

O senhor é padre secular. Como vê a Renovação Carismática?
MGS – Depende do modo que é feito, de quem está administrando. As coisas na vida podem ser boas ou ruins. A Carismática ajuda a rezar. Agora, quando não tem o espírito concentrativo não é bom. A oração é estar sintonizado com Deus.

Por essa linha de raciocínio, o senhor não parece ser contra as outras religiões.
MGS – Estando em sintonia com Deus a gente respeita. Cada ser humano é uma obra-prima que Deus fez. E eu respeito muito isto.

O senhor tem alguma crítica a fazer ao catolicismo?
MGS – Não. Em nenhuma religião se pode querer perfeição. São homens que estão à frente. A maior grandeza e beleza é saber que a igreja é feita pelo homem e, ainda assim, é santa. Ela é santa pela sua doutrina, pelo seu espírito. O espírito de Deus. Porque todos nós somos pecadores. Perfeito só Deus. O Espírito Santo é quem sustenta a Igreja, nós apenas somos os colaboradores.

O senhor tem leveza para falar de religião. Como tem visto a intolerância religiosa?
MGS – Para mim é ‘curteza’ de cabeça. Não é maldade. A burrice é pior do que a maldade, porque quem é mau pode se transformar e querer fazer o bem. E quem nasce burro não muda. Morre deste jeito.

A Igreja Católica tem colhido assinatura de fiéis contra a lei do aborto. O que o senhor pensa sobre esse tema?
MGS – Sou contra o aborto. Mas não porque sou católico ou por ser padre. Sou contrário porque é uma lei de Deus. Ele disse: Não matarás. E a partir do momento em que o espermatozóide se encontra com o óvulo já existe uma vida. Dali vai nascer um homem. Você já viu alguém plantar banana e nascer abacaxi? Inevitavelmente dali vai nascer um ser humano. É uma questão de lógica.

O senhor teve alguma dúvida quando se tornou padre? O senhor teve namoradas?
MGS – Namorar? De forma alguma. Entrei no seminário com 12 anos, não tive tempo de pensar nisto (risos). Com 12 anos a gente pensa em ser várias coisas. Queria ser advogado e policial. Até hoje paro para assistir uma parada. Agora, meus pais eram muito religiosos e isso me influenciou bastante.

Vamos mudar um pouco de assunto. O senhor era muito amigo do senador Antonio Carlos Magalhães (falecido no dia 20 de julho). Era uma amizade apenas pessoal ou tinha alguma coisa a ver com a política?
MGS – Nada de política. Tenho horror a política. Eu nunca perguntei para o Antonio Carlos qual era o partido dele. Isso era problema dele. Eu simplesmente gostava dele. Ele podia ser do partido ‘popopo’ do partido ‘pipipi’, que para mim era indiferente. A minha amizade com ele é a mesma que eu posso ter com outro padre. Na minha vida tenho pouquíssimos amigos. Amizade não é algo gratuito como o amor. Para eu ser amigo de algum esse alguém tem que querer ser meu amigo também. No amor isso não funciona. A pessoa pode amar alguém e não ser amado por ela. Na amizade a gente não quer saber se o nosso amigo é bom ou ruim.

A amizade de vocês surgiu como?
MGS – Começou há pouco mais de 40 anos, quando dom Eugênio Sales era Cardeal. Passei a acompanhá-lo. Na época Antonio Carlos começou a fazer a Bahia crescer. Então o acompanhava fazendo o trabalho religioso. Ele fazia a Bahia crescer politicamente e nós, religiosamente. A partir daí comecei a celebrar a missa do aniversário dele, que era na Igreja do Bonfim, depois passou a ser no Pelourinho. Amigo que é amigo sabe o que é bom e o que é ruim do outro. O que é bom a gente aplaude e o que não é a gente chama e conversa e chama a atenção.

Em algum momento senhor deixou de aplaudir ACM?
MGS – Algumas vezes sim. Se eu não estivesse de acordo eu dizia a ele. Nunca tive problema com isso.

Ele aceitava o que o senhor dizia com facilidade?
MGS – Aceitava com muita tranqüilidade e equilíbrio emocional. Aliás, eu nunca o vi desequilibrado emocionalmente.

ACM confessava-se ao senhor, padre?
MGS – (risos) Não. Não. Amigo não se confessa a amigo. Eu o aconselhava a se confessar com outros padres. Na verdade, a gente conhece a alma de um amigo.

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